quarta-feira, outubro 05, 2016

Pastoral da Criança: 33 anos salvando vidas

Por Deniele Simões


Mais de três décadas se passaram desde que a médica sanitarista e pediatra, Dra. Zilda Arns Neumann, deu início às primeiras ações da Pastoral da Criança, na cidade de Florestópolis (PR).
Dr. Nelson Arns é coordenador adjunto da Pastoral da Criança

O trabalho começou em uma paróquia daquele município e foi se expandindo ao longo dos anos. Hoje, a Pastoral está presente em todas as dioceses brasileiras e em outros 17 países da África, Ásia, América Latina e Caribe, sendo reconhecida como uma das mais importantes instituições mundiais voltadas ao desenvolvimento integral infantil.

Em visita a Curitiba, entrevistei o coordenador nacional adjunto e filho da fundadora, Dr. Nelson Arns Neumann. O médico avalia quem, nesses 33 anos de atuação, muitos fatores contribuíram para a mudança no panorama da saúde nas comunidades.

A criação do Sistema Único de Saúde (SUS), a melhoria da renda dos brasileiros e dos índices de saneamento básico no país, a mudança do foco na abordagem médica, com ênfase na prevenção e na imunização por meio de vacinas, são alguns dos fatores apontados pelo médico.

Somando-se a esses avanços, a atuação dos líderes da Pastoral em todo o Brasil foi provocando uma mudança de comportamento nas comunidades mais pobres. “Esse processo foi muito interessante e hoje a gente vê as famílias mais pobres sendo mais proativas e seguras no que se deve fazer”, aponta.

Se a desnutrição e a desidratação eram grandes desafios para a Pastoral na década de 1980, hoje a obesidade e a alimentação inadequada são questões preocupantes. Ambas podem trazer consequências sérias para os bebês. A campanha Mil Dias tem como foco esses novos desafios e vem sendo trabalhada junto às comunidades atendidas.

Voluntariado
Voluntárias Elisabete e Maria José, na sede da Pastoral
Hoje, a Pastoral da Criança acompanha mais de 1 milhão de crianças de zero a seis anos em todo o Brasil. Esse acompanhamento é feito por 182.911 voluntários.

Nelson Arns atribui o grande número de voluntários a vários fatores. Um deles é o fato de o trabalho ser voltado às crianças. O segundo é o impacto das ações promovidas, que acontecem a partir da formação e do trabalho direcionado. “Após a formação, sempre tem o desafio da realidade, na paróquia, na diocese, no estado, na coordenação nacional; com isso, a pessoa sabe que está fazendo o bem, que não está só e que trará resultados concretos para o resto da vida dessa criança”, acrescenta.

A professora aposentada Elisabete Piassetta, de Curitiba, sonhava em ser voluntária e, inspirada pelo exemplo deixado pela Dra. Zilda, entrou para a Pastoral, há três anos.

Elisabete mora perto da sede nacional da Pastoral e sempre teve curiosidade conhecer o trabalho realizado lá dentro. Um certo dia, resolveu entrar para conhecer e acabou se tornando voluntária.

Na comunidade onde morava não havia famílias em situação de vulnerabilidade social, então adotou uma comunidade. “Cresci e aprendi tanto depois que entrei como voluntária; ganhei um grupo, aprendi a ver como é o trabalho na comunidade, como as coisas acontecem, quais são os caminhos”, explica.

Para a aposentada, integrar a Pastoral é um trabalho de doação. “É apaixonante quando você vê aquelas pessoas mais simples se doando da forma como elas se doam. Deixando o sábado e o domingo para uma comunidade, em prol deles.”

A dona de casa Maria José Martins Fabiano é voluntária há 17 anos e hoje coordena o núcleo da grande metrópole de Curitiba, com 601 líderes que cuidam de cerca de 2.000 famílias.

“Tudo o que a gente faz procura fazer com amor e carinho, mas, quando a gente chega na comunidade e vai querer doar alguma coisa, na verdade, é a gente recebe”, diz.

A partir da presença dos líderes nas comunidades, as famílias acabam mudando a forma como vivem, a partir dos conhecimentos adquiridos, e passam a ajudar-se mutuamente. “Na parte da alimentação, pessoas que acompanhei, desde quando eu era líder, estão estudando nutrição por causa da Pastoral. Algumas dizem que aprenderam a comer por causa da Pastoral”, explica Maria José. 

Dra. Zilda Arns, idealizadora do trabalho
Trabalho reconhecido
Criada em 1983, a Pastoral da Criança é reconhecida como uma das mais importantes organizações
mundiais a trabalhar em programas voltados ao desenvolvimento integral das crianças. A coordenação nacional do organismo está instalada em Curitiba (PR)
Números
Principais programas:
– Acompanhamento de crianças de zero a seis anos.
– Acompanhamento de gestantes.
– Ações complementares envolvendo brinquedos, brincadeiras, alimentação, hortas caseiras, entre outras.
– Controle social de políticas públicas através da ação junto a Conselhos de Saúde, Direitos da Criança e do Adolescente, nos âmbitos nacional, estadual e municipal.
Principais indicadores (1º trimestre de 2015):
– 1.092.970 crianças acompanhadas.
– 902.685 famílias cadastradas.
– 65.599 gestantes acompanhadas.
– 182.911 voluntários em nível comunitário, sendo 101.682 líderes.
– Presença em 33.558 comunidades, em 3.717 municípios brasileiros.
– Presença em 17 países, além do Brasil.
Fonte: Sistema de Informação da Pastoral da Criança

Presença internacional
Além do Brasil, a Pastoral da Criança está presente em outros 17 países, repetindo a experiência de sucesso em localidades onde a situação é semelhante à realidade brasileira de 33 anos atrás.

Mas, foi há quase seis anos, quando a Pastoral recebeu um prêmio internacional, que a experiência no exterior começou a tomar força. Com o dinheiro que chega do exterior, foi possível organizar a Pastoral em outros países.

Só que, para que isso se tornasse possível, foi necessário montar uma Pastoral em outro país, com legislação menos burocrática. “Infelizmente, o Brasil é um país muito egoísta e a legislação não nos permite, como Pastoral da Criança do Brasil, ajudar a Pastoral da Criança de outros países”, explica.

A partir da fundação da Pastoral no Uruguai, é possível depositar o recurso que chega dos Estados Unidos e fazer as doações para que o trabalho avance nesses países.

Dra. Zilda Arns, morta em janeiro de 2010, durantemissão no Haiti, deixou sua marca na história do Brasilao fundar e coordenar a Pastoral da Criança e Pastoral
da Pessoa Idosa. Viveu para defender as crianças, gestantes e idosos, visando a uma sociedade mais justa, fraterna, com menos doenças e sofrimento. Mais do que os 19 prêmios nacionais e internacionais recebidos e dezenas de homenagens, o legado deixado por ela permanece vivo e a obra ganha, a cada dia, mais adeptos.

A realidade do povo assistido pela Pastoral no exterior é bem diferente da brasileira. Segundo Nelson Arns, a Guatemala, um dos países atendidos, apresenta um dos piores índices de desnutrição mundial.

A partir do trabalho promovido pelo organismo e do envolvimento das comunidades, já é possível ver a situação mudar.

Embora o índice de desnutrição seja de 40% e a existência de 23 línguas oficiais imponha grandes desafios, já são 6.000 crianças acompanhadas.

“O pessoal tem muito boa vontade e começa a superar os diversos desafios. São leigos atuantes, assim como existe no Brasil, já ganhando escala, indo para a sétima diocese”, conta.

Ainda de acordo com Arns, outros países onde o trabalho apresenta progresso são a Colômbia, República Dominicana, Haiti, Guiné Bissau e Filipinas. “É um processo dentro de cada realidade, adaptado à cultura”, justifica.


Questões como vacinação, aleitamento e parto natural são consideradas universais e, de acordo com ele, o grande desafio tem sido trabalhar esses conceitos de acordo com a adaptação cultural de cada país.

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